Tolstói : escreve desde ti mesmo



Lev Tolstói foi um homem em busca de seu aperfeiçoamento como pessoa durante a vida.
Um escritor russo de obras inesquecíveis : Guerra e Paz (1869), Anna Karenina (1877), A Morte de Ivan Ilitch (1886) e muitos outros romances, contos, ensaios.
Quero focar neste artigo em seus Diários, uma janela da alma deste escritor e de seus desafios neste ofício da escrita e da coerência existencial.


Apesar de ter obtido muitas conquistas desde que comecei a estudar a mim mesmo, todavia estou muito descontente com minha pessoa. Quanto mais se avança no aperfeiçoamento de si mesmo, mais defeitos encontramos, Sócrates estava certo ao dizer que o maior grau da perfeição humana é o de saber que nada sabe"
(8 de abril, 1847)

Na primeira parte dos diários, encontramos um jovem preocupado com o cultivo de seu espírito e inteligência e lemos suas regras para submeter rigorosamente os seus vícios de amor próprio e cobiça. Vemos também a sinceridade, com que Tolstói declara as dificuldades neste regime de vida, e ele cria inclusive um Caderno de fraquezas, uma idéia copiada de Benjamin Franklin, que anotava quando cometia desvios das suas regras de conduta :
"Segundo dia de preguiça. Não cumpro o que foi traçado. Por quê? Não entendo. Porém, não me desespero, vou forçar-me. Ontem, além de não ter cumprido o determinado, ainda infringi a minha regra. Agora, já não infringirei a regra de, na aldeia, não ter nenhuma mulher, exceto em algumas ocasiões que não buscarei, mas que também não deixarei passar. (...) 

" É mais fácil escrever dez volumes de filosofia , que levar à pratica
uma só regra, não importa qual "
(17 de marzo, 1847)

Neste processo constante de auto-análise o escritor revela sua disciplina na escrita e as exigências que tinha consigo mesmo nesta aprendizagem constante:
"Dediquei a manhã inteira a ler e escrever. escrevi pouco, não estava com bom humor e temia corrigir. Regra : é melhor tentar e estragar (alguma coisa que se possa fazer novamente) do que não fazer nada "
(21 de março de 1851)

"Quando durante o processo de escrita me chegam vários pensamentos confusos e eu tenho vontade de levantar, não me permito fazer "
(28 de junho de 1853)

"Necessito escrever e escrever. Este é o único caminho para conseguir uma forma e um estilo"
(24 de setembro de 1852)

Vemos nestes apontamentos sua disciplina e força de vontade.
Com o envelhecimento, depois de ter participado da Guerra da Crimea e de suas viagens à Europa se revela um Tolstói mais crítico mais voltado à sua vida em família e ao campo.
O escritor passa por uma crise criativa e no período de 1865 até 1878, não temos
nenhuma anotação em seus diários.
Em 1886 publica seu famoso relato : Quanta terra necessita um homem.
Fruto de um novo modo de vida, ascético e repleto de leituras teológicas e filosóficas.
Sua crítica ao regime de servidão lhe causa muitas discussões em família.

"Nos parece natural viver com trabalhadores subjugados para nossa comodidade, como servidão. Inclusive, nos parece, como dizem as crianças, que nada os obriga, que foi uma escolha ser lacaio, o, como diz o professor: se uma pessoa não se sente humilhada por esvaziar meu urinol, então não a estou humilhando (...). Contudo , toda esta situação é uma coisa a tal ponto contrária a natureza humana que seria impossível, não somente criar, mas também imaginar uma situação similar se não fosse a consequência de um certo mal que nós conhecemos, e que nos persuadimos, faz muito tempo atrás.
Se não tivesse existido a escravidão, não se poderia inventar nada semelhante.
Tudo não é somente consequência da escravidão, mas a escravidão mesma, de outra forma "
(8 de noviembre. 1889)

Nos seus diários muitas vezes encontramos a semente de uma das suas obras literárias, seus pensamentos e conseguimos entender melhor os dramas pessoais vividos que nutrem os conflitos existenciais dos seus personagens.
Em três obras Tolstói conversa de perto com a questão da morte :
Senhor e Servo, Três mortes e A Morte de Ivan Ilitch.
No próximo episódio vamos conversar sobre esta última obra e pensar sobre este conselho do escritor, ou "memento mori" , expressão latina que significa :
"lembre-se que que você é mortal "
Sempre vale a pena recordar esta verdade.

Escute o áudio deste episódio no link abaixo:

Dica de livro :



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